O reconhecimento da importância da arte rupestre da Península Ibérica associada às fases iniciais da arte do Paleolítico intensificou o debate em torno da possível participação dos Neandertais nestas ações iconográficas desde o Paleolítico Médio. O projeto FIRST ART visa esclarecer estas abordagens através de uma extensa amostragem de crostas de carbonato de cálcio que cobrem ou servem de base para estas figuras. Metodologias como U/Th para a datação, estudos de caracterização de pigmentos através da espectroscopia Raman e FTIR, datação C14 AMS e a sequenciação de ADN serão utilizadas para ajudar a determinar a espécie humana envolvida na criação das mais antigas manifestações artísticas. Esta investigação multidisciplinar irá contribuir para o nosso conhecimento sobre as origens e técnicas da arte rupestre mais antiga do mundo.
A região da arte do Côa acumula mais de 30 anos de investigação científica e prospecção arqueológica, reflectidas, entre outros aspectos, no avolumar de descobertas de arte rupestre. Este texto pretende divulgar uma nova síntese da prospecção e inventário da arte do Côa, quantificando os achados dentro da sua longa diacronia. Por um lado, pretende-se actualizar a informação. Por outro, pretende-se também antecipar um próximo e ambicioso projecto de prospecção de arte rupestre na região, o qual, não sendo final, como nunca pode ser, tem a intenção de trazer os dados do inventário para níveis muito mais completos, em termos quantitativos e também na área prospectada dentro da região.
No âmbito do projeto de investigação LandCRAFT, apresentamos as estratégias para a proteção e conservação de um conjunto de abrigos com pinturas rupestres pertencentes à tradição de Arte Esquemática no vale do Côa. O projeto desenvolve-se numa estratégia de investigação pioneira em Portugal, constituído por uma equipa multidisciplinar que estabelece uma nova abordagem metodológica e científica aliando estritamente, desde o seu início, o conhecimento em Arqueologia e Conservação do Património Cultural. Este projeto, em curso, tem como premissa o estudo da arte rupestre na sua relação íntima com a arquitetura natural do lugar e com a paisagem envolvente. Esta metodologia de abordagem será determinante para alicerçar as bases necessárias na gestão dos sítios que garantam, a longo prazo, a salvaguarda desta herança ancestral.
No Vale do Côa, a utilização da pintura em arte rupestre surge quantitativamente de forma muito reduzida e unicamente em tempos pré-históricos, face à predominância da gravura no decurso dos longos milénios em que signos e imagens foram sendo ali criados. Esta limitação quantitativa não se reflecte na sua relevância científica, como o presente texto procura demonstrar. No contexto de uma síntese sobre os principais conjuntos de pintura pré-histórica nesta região, que se podem dividir em três grupos principais, cronológica e culturalmente subsequentes, será trazida à estampa notícia preliminar de uma das mais surpreendentes revelações que o Vale do Côa guardou para o século XXI: a presença de composições pictóricas que denotam uma clara convergência estilística com algumas manifestações de Arte Levantina.
No centro do território português, no concelho de Mação, no topo de uma crista quartzítica, localizam-se os abrigos do Pego da Rainha. Estes dois sítios arqueológicos apresentam um reportório temático enquadrado na pintura rupestre esquemática, sendo maioritários os motivos de barras e pontos. Esta simplificação temática corresponde a um programa conceptual específico das comunidades do IV e III milénios a.C., sendo os ideogramas as representações mais frequentes. A sua localização destacada, no topo de uma das grandes cristas quartzíticas que cortam o vale do Tejo, possibilita uma efectiva antropização da paisagem, enquadrando-se num território onde arte rupestre, núcleos habitacionais e contextos funerários se interligam. Apresentamos neste trabalho o Abrigo do Pego da Rainha 1 e o Abrigo do Pego da Rainha 2, descrevendo a iconografia presente e as possíveis interpretações, enquadrando-os no território destas comunidades, possibilitando assim uma abordagem de conjunto, que permite sair do hermetismo científico em que frequentemente a arte rupestre se insere.
Afloramento sub-horizontal, de xisto, de encosta dos contrafortes da Serra da Guardunha, contém gravuras executadas através de picotagem, incisão linear e, sobretudo, abrasão. Aquele repertório é formado por covinhas isoladas ou estruturadas em grupos, círculos, manchas de negativos, pequeno colubrídeo, conjuntos de filiformes e de sulcos abradidos. Reconhecem-se possíveis antropomorfos esquemáticos, em forma de phi ou arboriformes, flechas, cruciformes, séries de traços paralelos, espinhado, escalariformes, reticulados e fusiformes, alguns intensamente escavados e possuindo dimensões assinaláveis, tanto no que concerne ao seu comprimento, como em largura e profundidade. Eles traduzem acções individuais, repetitivas, decorrentes de participação gráfica não figurativa, que paralelos etnográficos e comportamentos religiosos indicam integrarem a tentativa de proceder ao encontro com o mundo transcendente.
No presente artigo pretende-se dar a conhecer as gravuras labirínticas da estação arqueológica do Castelinho, um sítio fortificado da II Idade do Ferro, romanizado, localizado no Nordeste Transmontano (Portugal). Apresenta-se uma relação destes motivos gravados com os restantes congéneres conhecidos no Noroeste Peninsular, apontando alguns significados de cariz simbólico. De forma genérica, as gravuras labirínticas do Castelinho, embora apresentem um aspeto algo tosco, procuram representar o labirinto clássico, estudado nos últimos dois séculos por diferentes investigadores a nível nacional e internacional. Tendo em conta o contexto arqueológico das gravuras, assim como as suas semelhanças morfológicas com outras composições peninsulares, a interpretação vai no sentido de estarmos perante um tipo de iconografia executada nos primórdios da ocupação romana do Noroeste peninsular, mas que parece ainda refletir crenças das comunidades proto-históricas.
Entre os sítios proto-históricos do Alto Côa destaca-se o monte de São Cornélio, pela sua altimetria, possuindo uma posição dominante e de amplo controlo visual da paisagem envolvente, sendo também o único povoado da região onde se conservam duas linhas de muralhas. Em 2021/2022, num quadro de minimização de impacto da colocação de uma torre de videovigilância de incêndios, foi alvo da realização de sondagens que identificaram três construções pétreas de configuração subcircular. No interior da estrutura 2 recolheu-se cerâmica com a característica decoração a peine, de tipo Cogotas II, bem como quatro seixos, três dos quais têm a particularidade de apresentarem incisões de natureza e compreensão diversa. Neste trabalho os autores apresentam o estudo desses seixos, sugerindo diversas possibilidades interpretativas alicerçadas nas caraterísticas tecnológicas dos traços.
É objetivo deste texto apresentar uma síntese sobre topónimos e crenças associados a lugares com podomorfos, no nordeste transmontano. A finalidade é perceber a relação entre as memórias populares e estes lugares e de que modo tal análise poderá contribuir para o melhor entendimento deste fenómeno do passado. O estudo foi realizado através de consulta documental e trabalho de campo. Os dados foram trabalhados de forma comparativa e relacional. Do conjunto dos 19 afloramentos inventariados, 14 têm nomes próprios e oito têm crenças associadas. Verifica-se que estas crenças se inserem, maioritariamente, no âmbito do cristianismo e, raras vezes, no âmbito de acontecimentos históricos, de forma deformada.
De entre os diversos aspetos ligados à molinologia o tema dos grafitos tem granjeado escassa atenção da comunidade científica. Como contraponto a esta situação, o inventário e caracterização dos moinhos de água do concelho de Lousada, realizado entre 2011 e 2021, incluiu o registo de todas as insculturas presentes nas estruturas moageiras. Este estudo resultou na catalogação e caracterização de 436 grafitos molinológicos, cronologicamente balizáveis entre a segunda metade do século XVIII e o terceiro quartel do século XX, onde a multiplicidade de formas e tipologias tornam evidente a complexidade do quadro sociocultural associado à sua produção.